domingo, outubro 13, 2013

segunda-feira, setembro 30, 2013

Hei-de voltar


Partir traz sempre consigo sentimentos contraditórios. A ebulição do espírito começa logo no momento em que a hipótese surge. Depois vai aumentando à medida que o destino avança e vai ganhando forma. Desta vez não foi diferente. Com o passar dos anos a alma enrijece e deixa de nos embaciar os olhos quando no bulício  do vaivém dos aeroportos roubamos um último abraço aos que ficam. A dor torna-se parte de nós.

Quem nunca partiu não sabe o quão fácil e difícil é partir. Mas há alturas em que isso se torna particularmente doloroso pelos riscos acrescidos que envolve, pela separação dos mais novos e dos mais velhos, pelo afastamento em relação àqueles que um dia não nos reconhecerão, pela ansiedade que cria naqueles que um dia abalarão sem que no instante da partida tenhamos a certeza de que um dia voltaremos a partilhar ternuras e carinhos, gestos simples de quem nos faz ser como somos, gestos que nos aconchegam os olhos no poente.

Não parto despeitado, não parto revoltado. O tempo da paixão e da revolta não são próprios de um pensamento adulto, de uma racionalidade afectuosa como a que cultivo junto dos que me rodeiam. Parto triste. Parto só embora saiba que nunca tantos estiveram comigo nesta hora. Por deixar para trás um povo que sofre diariamente na pele a mediocridade petulante, incompetente, provinciana e ignorante dos seus dirigentes.  

Parto porque existe um momento na vida de todos nós em que temos de olhar para o que está mais distante para nos podermos aperceber melhor dos pormenores do que está perto. Longe de mim, direi, também perto de vós como nunca tive a pretensão de estar. E nas semanas que antecederam a minha partida muitos foram os que saídos do nada me vieram oferecer um sorriso, uma palavra amiga e compreensiva, os que entenderam a minha decisão melhor do que alguma vez pudera imaginar. É isto que me aproxima dos meus e me afasta dos apêndices que neles se penduram para melhor espremerem as tetas exauridas da nação.

Vejo nos olhos dos que deixo mais do que a tristeza, mais do que a dor e o afecto. Vejo neles a esperança, a certeza de que um dia a bonança virá, sem ilusões quanto ao regresso de Sebastião, mas com a segurança de quem já viveu e sabe a inevitabilidade de que melhores dias virão. Porque de homens bons se fazem os mundos, porque sem homens bons uma nação não sobrevive, porque sem homens bons não há democracia que resista. 

Não sei quando terminará o tempo da canalha. Não sei quando é que os partidos perceberão que homens como Rui Moreira “não podem” ser candidatos independentes porque tinham a obrigação de sê-lo nos partidos. Do mesmo modo que homens como Seara, Amorim, ou Menezes “não podem” ser candidatos de partido. São dois pequenos exemplos tirados do nosso quotidiano recente. São exemplos que tornam a nossa política pequenina.

Ler a notícia de um semanário, de sexta-feira passada, que nos dá conta de que uma presidente de junta de freguesia de uma cidade como Lisboa é capaz de se recandidatar e encabeçar a lista de um partido cujo número dois foi por si própria denunciado e é agora acusado de “canalizar para si receitas das Componentes de Apoio à Família entregues na tesouraria da Junta (...) a pretexto de efectuar pagamentos de aquisição de materiais e pagamentos ao pessoal de limpeza”, “acedendo o arguido, deste modo, às verbas em numerários geradas pelos pais dos alunos” por se encontrar a “vivenciar  um contexto pessoal de dificuldades financeiras”, pelo que decidiu fazer sua “a quantia em numerário” de “€ 13.104,35”, segundo reza a acusação do MP, é apenas mais um exemplo da chafurdice em que o País se encontra e do estado de pré-putrefacção em que o colocaram.

Penso que não preciso de dizer mais nada. A ferida já foi suficientemente escarafunchada nas últimas semanas aos olhos de todos para termos a obrigação de evitar a gangrena.

Espero em breve poder concentrar-me no meu trabalho, profissional e académico, com o empenho que a distância me exige para que frutos possa dar.  E um dia, meus caros amigos, minha gente querida de alma lúcida, ter-me-ão de volta. Não darei aos meus críticos o prazer da certeza do meu não regresso. Até lá aproveitarei o tempo para ir lendo e escrever o que ficou por escrever no último ano. Pensarei convosco em voz alta, mesmo estando longe. Porque as trovas que o vento leva também regressam renovadas se soubermos acompanhá-las, limar-lhes as arestas e transmiti-las às novas gerações.

Todos merecemos um futuro. Todos somos pouco para construí-lo. Todos temos a obrigação ética e moral de exigir melhor, de colocar a “cabeça no cepo” por uma alteração e renovação duradoura das circunstâncias. Um homem não é a sua circunstância, um homem é o seu combate. E em muitos casos dura toda uma vida.

Espero, por tal razão, que os que ficam não esmoreçam nesse combate e que coloquem em cada luta o peso do bom senso, a força da lucidez, a riqueza do verbo, a clareza indelével de um raciocínio lúcido, leal, coerente e sempre presente nos momentos em que muitos querem que claudique.

Porque os velhos não podem continuar a morrer de vergonha e desprezo atrás de uma árvore para que a canalha engorde, para que a pacovice diletante dos acomodados triunfe. Onde quer que eu esteja estarei convosco nesse combate e não regatearei esforços para que o sorriso das crianças do meu país não acabe no final da adolescência transformado no rosto encovado e macilento de um desempregado.

Os canalhas nunca entenderão isto. Mas também não é preciso. Basta-me saber que os portugueses o entendem.


(Londres, Terminal 3 do Aeroporto de Heathrow, em 29/09/2013, dia que antecede o recomeço do combate)

quinta-feira, setembro 19, 2013

"Bad customer service" em português diz-se PT

 
Fui a uma loja da PT para mandar desligar uma linha telefónica e de Internet do meu escritório. A primeira coisa que querem saber é qual o motivo, como se eu tivesse de lhes dar satisfações sobre as minhas decisões. Depois, digo à simpática menina que me atendeu que só pretendo a linha desligada a partir do final do mês, isto é, 30 de Setembro. Diz-me que não pode fazer isso porque a interrupção do serviço demora "até 15 dias" e ela, pobre criatura, não sabe quanto tempo os eficientes serviços da sua empresa levarão para desligar a citada linha. A seguir, aconselhou-me a só fazê-lo para a semana, para não correr o risco deles me desligarem a linha já hoje, ou amanhã, sabe-se lá. Porque demorando "até 15 dias" nada impede que o corte não seja imediato. Perguntei-lhe se nessa altura poderia liquidar todas as minhas dívidas para com eles até esse dia. Também não posso. Terei de aguardar mais 15 dias por uma factura que me será enviada para acertos, independentemente de depois dessa data eu estar na Conchinchina. Como se tudo não fosse já suficientemente esclarecedor ainda me sugeriu que só voltasse à loja PT depois da próxima quarta-feira, dia 25, porque durante a próxima semana não terão sistema.

Depois disto só me apetece perguntar o que seria de nós sem estas empresas, como a PT, nas quais metade da classe política e dos nossos gestores se revêem, que beneficiando de condições únicas de mercado ainda conseguem prestar ao cliente um serviço de trampa. Aposto que se fosse para me ligarem o MEO não demoravam "até 15 dias".

terça-feira, julho 16, 2013

Quanta saudade...

 
"Que futuro pode ter uma sociedade sem esperança e sem poesia? Uma sociedade em que a esperança se reduziu progressivamente à mera sobrevivência individual e cujos valores se personificam em modelos como Silvester Stallone ou Madonna? Vejo a sanha com que os nossos líderes políticos e os "pivots" dos telejornais espezinham furiosamente os restos da tragédia em que descambou a utopia comunista e pergunto-me se, neles, nesses terríveis destroços, eles odeiam os crimes do socialismo real (o maior dos quais terá sido, provavelmente, o da traição à utopia igualitária) ou se não é, antes, a própria ideia de utopia e de esperança que, incapazes de compreender, eles sobretudo odeiam e perseguem. (...)

Em Portugal, a metástase cavaquista do fenómeno contamina até hoje os que, pessoas e partidos, aparentemdente deviam estar do outro lado. O "fim das ideologias" e o "fim da História" são saudados euforicamente por quase todos e os raros que persistem em alguma forma de fidelidade ou de fé são olhados despeitadamente de viés como sobreviventes dinossáuricos.",  JN, 07/10/1992  

quinta-feira, julho 11, 2013

Um Presidente vocacionado para cenários de terror


 
A comunicação que o Presidente da República fez ontem ao País constituiu um dos mais altos momentos de inaptidão política de que há memória na nossa democracia.

Convirá dizer, antes de mais, que não me custa aceitar as razões apresentadas pelo PR para a não realização de eleições. Também tenho sérias dúvidas de que as mesmas resolvessem o problema, atenta a falta de consistência da oposição, mas ao contrário dele não me sinto imbuído de uma áurea que me permita numa democracia decidir o que é melhor para os "súbditos" sem consultá-los.

A argumentação de ordem económica e financeira também é compreensível. O cumprimento do memorando de entendimento com a troika e chegar ao final do período de ajustamento em Junho de 2014 sem ter de pedir um segundo resgate, e com a garantia de que tal não acontecerá nos anos seguintes, é claramente um objectivo nacional e que não deverá ser escamoteado.
 
Mas posto isto, que é a parte compreensível da mensagem de ontem, tudo o mais é ininteligível.
 
Depois de ter andado durante mais de dois anos a fomentar a solução da coligação PSD-CDS/PP para obviar ao desconforto provocado pelo chumbo do PEC4, que fora tão elogiado pelos banqueiros e pela chanceler alemã como as políticas de Vítor Gaspar, verifica-se que o PR se tornou em mais um factor de instabilidade, aliás com reflexo imediato na agitação dos mercados que se registou esta manhã. 
 
Durante dois anos o PR assistiu ao esboroar da coligação, por vezes fazendo apelos no sentido de levar os protagonistas à união e à razão, sempre sem tomar posição que vincasse o seu estatuto e autoridade, assim perdendo força e capacidade de intervenção.
 
Desta forma, perante o avolumar de sucessivos fracassos em matéria económica, de controlo do défice e do desemprego, de ausência de reformas dignas desse nome, com um falhanço fiscal em toda a linha que desacreditou o ministro das Finanças e o primeiro-ministro, o resultado só poderia aquele a que se chegou com uma coligação e um governo liquefeitos, com a confiança pelas ruas da amargura e os mercados desconfiados quanto à nossa capacidade de chegarmos a Junho de 2014 sem um segundo resgate. Ou seja, chegamos a Julho de 2013 numa situação em tudo contrária à que foi prometida quer pelo PR quer pelos partidos que formam a coligação e venceram as eleições legislativas de Junho de 2011.
 
A solução proposta pelo PR não é neste momento solução de coisa alguma. É antes uma "não- solução". Em especial, porque volta a colocar-se à margem dessa mesma solução, deixando os partidos e o País entregues a si próprios, sem que de facto se vislumbre qual a solução final se os partidos - como é previsível - não se entenderem. 
 
Certo é que o PR não aceitou o que lhe foi proposto pelo primeiro-ministro Passos Coelho, pelo que o Governo irá assim continuar a "governar" em estado semi-comatoso, com um líder desacreditado e com um número dois e ministro dos Negócios Estrangeiros cujo sentido de Estado e palavra política deixam tudo a desejar, enfim, com uma ministra das Finanças de ocasião e sem estatuto, isto é, com o governo no limbo.
 
O PR voltou a ficar nas meias-tintas. Já não se trata de uma leitura minimalista dos seus poderes, mas antes de uma leitura desajustada e tardia desses mesmos poderes. Como agora é patente, o PR nunca devia ter viabilizado um governo como o que saiu das eleições de Junho de 2011.
 
Tal como então defendi, e isso se tornou mais evidente com o decurso do tempo e à medida que as pequenas crises - políticas, económicas e constitucionais - agravavam a crise mais geral, há muito que o PR deveria ter tido a iniciativa de promover a formação de um novo governo no actual quadro parlamentar. Ontem como hoje mostrou-se incapaz e revelou estar isolado e sem capacidade de manobra.
 
Quanto aos partidos, a começar pelo PS, seria bom que reanalisassem a actual situação política e os factos ocorridos nos últimos três ou quatro meses e colocassem a mão na consciência.
 
Finalmente, uma palavra final para Passos Coelho e que se resume a uma única pergunta: desautorizado pelo PR da forma como foi pela comunicação de ontem, de que está à espera para apresentar a demissão? Quanto mais tarde o fizer maior será a agitação dos mercados que ele tanto estima e maiores os riscos de condicionamento do regime por força das pressões externas. Se for isto o que pretende Passos Coelho poderá continuar como até aqui. Se tiver ainda alguma réstea de sentido patriótico então é melhor que se despache e se demita, assim facilitando a vida a quem, mesmo contra vontade, terá de encontrar uma solução que remedeie as asneiras que se andaram a fazer durante dois anos e numa altura em que tudo era possível menos o falhanço.  
    
  
 
       

sexta-feira, julho 05, 2013

Para fazer política é preciso ter batido com a cabeça muitas vezes...

O que Medina Carreira diz tem todo o sentido. E muito embora as generalizações sejam sempre perigosas, é hoje indiscutível que são mais os maus exemplos do que os bons exemplos.
As "jotas" são hoje um cancro do regime e mais do que nunca os partidos deveriam caminhar no sentido da mudança. A preparação dos jovens para a política faz-se nas escolas, na vida e nos partidos, após os 16 anos. Enquanto organizações autónomas dentro dos partidos as "jotas" não servem para nada. Basta olhar para o Parlamento e para os sucessivos Governos, dos titulares aos restante pessoal dos gabinetes, para já não falar nas empresas públicas, para se perceber o que tem sido produzido e qual tem sido o produto do trabalho das "jotas".
Há também bons exemplos, pois há, mas esses não precisavam das "jotas" para singrarem e se imporem. Os outros, os medíocres, é que sem elas não teriam obtido uma "licenciatura", não teriam sido autarcas, assessores, adjuntos, deputados e membros do Governo, não teriam sido administradores de empresas públicas, nem teriam arranjado empregos à custa destas. E isto é verdade tanto à direita como à esquerda.  

quinta-feira, julho 04, 2013

Uma PPP com a Maya?

Comprova-se que com a saída de Vítor Gaspar do Governo já não será possível recorrer ao Borda d'Água. Respostas para a crise, pelas declarações do sempre afável Marques Guedes, só mesmo através da leitura dos astros. Não há nada como a sinceridade.

Com meia dúzia como este estávamos safos


A entrevista que o Prof. Adriano Moreira ontem deu à TVI24 é toda ela um tratado de clarividência política. O modo afável, simples e directo como aborda as questões e a análise fluída, linear e esclarecedora, com uma clareza de raciocínio e lógica notáveis, são atributos que apesar dos anos continuam a fazer dele um dos grandes comentadores da actualidade política. É indiscutivelmente um dos grandes senhores do nosso tempo. Numa terra onde escasseiam os verdadeiros talentos na política seria bom que o ouvissem mais. Em especial o Presidente da República. E, se não for pedir de mais, espero que a TVI24 coloque a totalidade da entrevista online
 
"Nunca vi nada de equivalente na vida política" (sobre a actual crise e as circunstâncias em que aconteceu);
 
"O País vai a caminho da bancarrota";
 
"Nos últimos dois anos não fez nada do que anunciou" (sobre Passos Coelho);
 
"A fome não é um dever constitucional. Tudo tem limites";

"O Presidente da República deve assumir a autoridade que se espera do Presidente da República".   

quarta-feira, julho 03, 2013

Graças ao Luís Brandão

 
Mantens-te de pé como uma torre infeliz. Um coração sem alento
conserva-te vivo, desoladoramente vivo, obscuramente ineficaz.
O que buscas no bosque não é uma árvore, nem uma rosa silvestre.
O que buscas, o que desejas para ti, não é teu. O objecto do teu sonho não é senão o fruto do trabalho daqueles que não têm tempo para sonhar. Já não conversas com os vivos, as tuas palavras ostentam um brilho inútil, lembram-me uma candeia tentando iluminar o sol.
O teu cansaço é o de uma orquestra que acabou o concerto e não recebeu um único aplauso, a não ser o dos músicos que elogiam o seu maestro. O público já te virou as costas e sai com a frustrada sensação de um espectáculo medíocre, de um
tempo perdido.
Não te manterás de pé por muito tempo.

Joaquim Pessoa, in ANO COMUM.

terça-feira, julho 02, 2013

Um dia atípico

 
Dedicado a Sua Excelência o senhor Presidente da República e ao senhor primeiro-ministro. Em nome de Portugal e dos portugueses que estoicamente aguentam a insânia que grassa na associação de estudantes do ensino secundário que tomou conta do PSD e do Governo da nação.

A carta

Verdade seja dita que em cada dia que passa me sinto cada vez mais distante de Portugal e dos portugueses. E no entanto estou no meio deles, vivo no meio deles, penso no meio deles. Às vezes também com eles. Os meus defeitos serão os deles, as minhas virtudes, se algumas tiver, também serão as deles. Não consigo, talvez por isso, pensar em "off" da mesma maneira que outros conseguem falar. Dentro de mim tudo se passa em "on" e o "off" será sempre um prelúdio do fim.
 
Confesso que tenho alguma dificuldade em perceber os ínvios caminhos de algumas inteligências que têm o condão de transformar em obscuro o que é claro, de substituírem a transparência pela opacidade, de confundirem um segmento de recta com uma elipse.
 
Numa democracia adulta, com gente séria e intelectualmente honesta, a comunicação não tem segredos, a informação é facilmente acessível a qualquer cidadão e a interpretação dos factos estará sempre balizada pela realidade. O vazio não faz parte da cartilha comunicacional.
 
É certo que a ironia não sofrerá do mal de ausência, mas será sempre de mau gosto ironizar com o corpo ainda quente do moribundo. Porque ele poderá sempre despertar, ressuscitar, voltar ao mundo dos vivos, ainda que o faça em "off", enquanto os seus olhos rodam pela distância que os separa daqueles que procura encontrar.
 
A carta do ex-ministro de Estado e das Finanças não é um testamento político. Menos uma justificação de modéstia. Vítor Gaspar resolveu fazer uma partilha em vida e deixou preparada a habilitação de herdeiros. E isso justifica a chamada de Maria Luís Albuquerque à pasta das Finanças. Não há nisto nada de irónico. Ou de meteorológico, para recordar o almanaque de que todos falam. 
 
O legado que fica nem sempre representa o resultado de uma vida de trabalho. Por vezes será apenas o produto de uma vida vivida em "off", mesmo quando bem vivida.
 
O que ficou não constitui uma confissão de impotência, não significa um acto desesperado, nem é o epílogo de um período conturbado. E não será, seguramente, um acto de lealdade política ou de agradecimento. Uma carta constituirá sempre um testemunho para a posterioridade. Em "on". Tudo o que de bom ou de mau contiver ficará indelevelmente gravado.
 
Eu prefiro os que pensam, dizem e escrevem em "on". Sem rede. O incómodo que isso provoca é não raro uma forma de nos trazer à realidade, de nos fazer olhar à nossa volta, de nos ajudar a crescer.
 
O mesmo não digo da hipocrisia em "on". Esta não é um problema de carácter. Nem sequer da falta dele. É um problema de visão. Mas entre a falta desta em "on" e a franqueza em "off", ainda assim prefiro a primeira. 
 
Numa democracia a decência está sempre em "on". Numa democracia a gente séria não teme as palavras; sabe reconhecer os gestos, e responsabiliza-se. Gente séria não teme a transparência, enquanto qualidade que nos permite ver e inferir, ou os juízos que outros façam das nossas acções. Gente séria não funciona em "off". Está sempre em "on". Os outros, se quiserem, poderão sempre repudiar o legado. Em "on". De outro modo não funciona.    

sexta-feira, junho 28, 2013

Um homem de excepção

O Pedro Correia, sempre oportuno e atento, já tinha tido a justa lembrança de assinalar a obra do padre Lancelote Rodrigues, recentemente desaparecido. O Economist fá-lo agora. Para que aqueles que não tiveram o raro privilégio de com ele conviver em vida e conhecer a sua excepcional obra de apoio aos refugiados e aos mais desfavorecidos possam conhecê-la depois da morte. Nunca será demais, para que o exemplo perdure.

sexta-feira, junho 21, 2013

A ler

(clique na imagem para aumentar)

"O dr. Cavaco não é um palhaço (Deus me livre!), mas tudo indica que o país, coitado, é uma grande palhaçada" - Vasco Pulido Valente, Público, 21/06/2013

domingo, junho 16, 2013

Leituras (12)

 
"Strong democracy is a disctintively modern form of participatory democracy. It rests on the ideia of a self-governing community of citizens who are united less by homogeneous interests than by civic education and who are capable of common purpose and mutual action by virtue of their civic attitudes and participatory institutions rather than their altruism orn their good nature. Strong democracy is consonant with - indeed it depends upon - the politics of conflict, the sociology of pluralism, and the separation of private and public realms of action.
(...)
[S]trong democracy (...) can be formally defined as politics in the participatory mode where conflict is resolved in the absence of an independent ground through a participatory process of ongoing, proximate self-legislation and the creation of a political community capable of transforming dependent, private individuals into free citizens and partial and private interest into public goods".     
  

sexta-feira, maio 31, 2013

A ler

 
"Ora, quando o resto se afunda, é na liberdade que, em última análise, assenta o regresso a uma situação tolerável e 'normal'. E, deste ponto de vista, o sr. Gaspar e o dr. Cavaco estão de um lado e o dr. Soares de outro." - Vasco Pulido Valente, Público, 31/05/2013

quinta-feira, maio 30, 2013

As teias que o fisco tece

Ontem fiquei a saber que o fisco quer que entregue um anexo SS. Tal e qual. Acontece que, entretanto, o IRS já tinha seguido. O sistema informático aceitou a declaração sem o tal anexo. Mas, ainda assim, pelo que me disseram, era possível corrigir. Era, porque o dito sistema só aceita o anexo SS se lá tiver o número da Segurança Social. Pediram-me o número. Eu não tenho. Nunca tive, fui advogado a vida toda e o único número que tenho é o da minha Caixa de Previdência. E o de contribuinte. Disseram-me que vem no cartão de cidadão. Mas eu também não tenho cartão de cidadão. Só uso bilhete de identidade e só tirarei um cartão de cidadão quando aquele caducar. Não tenho que antecipar a receita do Estado, pois não? Será que vou ter de me inscrever na Segurança Social mesmo que não tenhamos nada a ver um com o outro e o número não sirva para nada? Só para satisfazer a gula burocrática e orwelliana dos senhores do ministro Gaspar?

Em tempo: Creio que se resolveu. Pena é que se tenha necessidade de chegar até aqui.

sábado, maio 25, 2013

Palhaços


Um tipo que não consegue rir-se de si nunca poderá ser palhaço. Para ser palhaço é preciso ser inteligente.

O Pessoa podia ter sido um palhaço.

sexta-feira, maio 24, 2013

A ler

 
"Sozinho, completamente sozinho, o dr. Cavaco Silva conseguiu arruinar a Presidência da República. A Presidência da República não tem hoje autoridade, influência ou prestígio." - Vasco Pulido Valente, Público, 24/05/2013 

Georges Moustaki

 
Vamos sentir a tua falta.

Leituras (11)

 
"Une organisation de parti doit, ensuite, faire montre de dynamisme. Il lui faut manifester ses capacités d'adaptation, de rénovation et d'innovation tant dans les idées que dans la façon de les promouvoir ainsi que dans son style d'action. 'Pour s'avancer vers le peuple, les partis n'ont pas besoin de lever le poing ou de se réfugier derrière l'éphémère autorité des chefs vieillissants. Ils doivent être en quête d'idéaux à partager, de sentiments et de styles de vie (...).. Ils devraient changer leurs méthodes d'organisation, expérimenter de nouvelles idées, imaginer de nouveaux liens entre les gens et les militants'. Le phénomène de réalignement atteste avec éclat du dynamisme d'une organisation capable de jeter son projet fondateur aux orties pour, se choisissant un créneau plus porteur, s'enraciner sur le versant d'un clivage différent de celui qui l'engendra." - Daniel-Louis Seiler, Les Partis Politiques en Occident, Sociologie Historique du Phénomène Partisan, Ellipses, Paris, 2003, p. 271. 

domingo, maio 19, 2013

Qualquer que seja o resultado de logo à tarde



Qualquer que seja o resultado de mais logo e da injustiça que foi o resultado de Amesterdão, no dia 15 de Maio pp., quero desde já agradecer-vos o prazer que foi ver-vos jogar durante toda esta época. A exibição de quarta-feira passada será sempre inesquecível para os amantes do bom futebol, do jogo limpo, da classe à flor da relva sem golpes nem esquemas. E com Jesus ou sem ele voltaremos a Amesterdão, ou a qualquer outro grande palco onde se dispute uma final europeia. Para ouvir "Cheira a Lisboa" ou o hino. Por vós, voltaria a levantar-me às 3 da manhã, para ter a certeza de não perder o avião.

Antes que seja tarde

Recebi o simpático convite que o meu amigo Pedro Correia me endereçou para ir à apresentação do seu livro "Vogais e consoantes Politicamente Incorrectas do acordo ortográfico", que melhor deveria ser chamado de acordo trágico pela forma como desmantela o nosso património.
O Acordo Ortográfico constitui assunto que a todos diz respeito, que a todos compromete e que pela oportunidade merece evidente destaque e atenção por parte de quem tem um mínimo de apreço pela nossa herança linguística.
Razões de ordem académica impedem-me de estar presente e de não só poder dar pessoalmente um abraço ao autor, como de escutar o Pedro Mexia, também ele autor, cronista, comentador, editor, homem de mil e um ofícios que pela sua qualidade intrínseca, simpatia, humor e lhaneza de trato muito aprecio.
Sei que não haverá repetição, mas nem por isso deixaria de aqui registar a minha satisfação pelo lançamento e de dar os parabéns a quem os merece.

Leituras (10)

Um livro já de 2000, mas indispensável para quem se interessa pelo fenómeno partidário ou quer simplesmente saber mais, seja pela quantidade de informação, oportunas referências e visão global, seja pela forma simples e directa como está redigido, que em nada compromete o rigor da abordagem.

segunda-feira, maio 13, 2013

Verdadeiras e actuais

"A political party which is widely seen as selling policies as private benefits runs the serious danger of losing elections" - Joseph A. Schlesinger, On the Theory of Party Organziation, The Journal of Politics, Vol. 46, No. 2 (May, 1984)  

sexta-feira, maio 10, 2013

Desabafo em português pré-AO


Não há paciência para este discurso redondo de tecnocratas semi-analfabetos que invadiu a comunicação social e as instituições.
O problema é muito simples e de fácil resolução:
1) Vivemos num Estado constitucional de direito democrático;
2) O primeiro-ministro foi eleito para cumprir um programa de governo respeitando a Constituição da República;
3) Se ao fim de quase dois anos não consegue fazer nada porque não consegue mudar a Constituição, nem governar respeitando as leis, é um incapaz, um falhado, um trolha, o que quiserem. E, nesse caso, deverá ser demitido, na eventualidade de não ter a honestidade intelectual e moral de reconhecer a sua própria incompetência.
Para governar sem Constituição e violando sistematicamente as leis da República, por razões económicas e financeiras, ou outras, não precisávamos de Passos Coelho, nem de Cavaco, nem de nenhum dos que está ou esteve em S. Bento ou Belém. Bastava uma besta qualquer com uma caneta na mão e uma polícia às ordens. Saía mais barato e não tínhamos de ouvi-los a dizer "besteiras". Era isto, e só isto, que precisavam de entender.
Tudo o mais, incluindo discursos tipo "convergência das pensões", é conversa para toscos. Em vernáculo "é uma porra". E eu estou cada vez mais farto de fazedores de "porra nenhuma" que falam "redondo". Eu e a maioria dos portugueses.

sexta-feira, abril 26, 2013

Pequena contribuição para o XIX Congresso do PS

"Leaders must have the vision to take their followers to a place they have never seen (in Henry Kissinger's phrase), but they must also be sure their people will follow them there - that the parade will not continue down Broadway when the leader turns onto Main Street. Party leadership is hazardous business, and mistakes can lead to electoral defeat or the choice of new leader (or both). On rare occasions, they can produce the ruination of the party" - Charles S. Mack, When Political Parties Die, Praeger, 2010
 
Tirando isso seria bom que aproveitassem para olhar para os últimos trinta e seis meses. E se não for pedir muito, já agora, também para os próximos vinte e quatro. Quanto ao mais, todos sabem onde moro. E o que penso.

quinta-feira, abril 25, 2013

O discurso de 25 de Abril do Presidente da República


"Nothing is more likely to generate a sense of cynicism about party elites than the feeling that politicians are narrowly utilitarian and prepared to exploit their situations for partisan or personal gain" - Paul Webb, Political Parties and Democracy: the ambiguous crisis, 2005 
 
Faço minhas as palavras de Paul Webb. Nada mais a acrescentar. 

terça-feira, abril 23, 2013

Mentes cativas

"Mas o 'mercado' - tal como o 'materialismo dialéctico - é apenas uma abstracção: simultaneamente ultrarracional (a sua argumentação supera tudo) e o apogeu do absurdo (não pode ser questionado). Tem os seus verdadeiros crentes - pensadores medíocres quando comparados com os pais fundadores, mas ainda assim influentes; os seus compagnons de route - que em privado podem duvidar dos princípios do dogma, mas não vêem alternativa a pregá-lo; e as suas vítimas, muitas das quais nos EUA, em especial, engoliram pressurosamente o seu comprimido e proclamam aos quatro ventos as virtudes de uma doutrina cujos benefícios nunca verão.
 
Acima de tudo, a servidão em que uma ideologia mantém a sua gente mede-se melhor pela sua incapacidade colectiva para imaginar alternativas. Sabemos muito bem que a fé ilimitada nos mercados desregulados mata: a aplicação estrita do que há até pouco tempo, em países em desenvolvimento vulneráveis, se chamava o 'consenso de Washington' - que punha a tónica numa política fiscal rigorosa, privatizações, tarifas baixas e desregulamentação - destruiu milhões de meios de subsistência. Entretanto, os 'termos comerciais' rígidos em que estes remédios são disponibilizados reduziram drasticamente a esperança de vida em muitos locais. Mas, na expressão de Margaret Tatcher, 'não há alternativa'.
 
Foi precisamente nestes termos que o comunismo foi apresentado aos seus beneficiários após a II Guerra Mundial; e foi por a História não apresentar alternativa aparente ao comunismo que muitos dos admiradores estrangeiros de Estaline foram arrebatados para um cativeiro intelectual." - Tony Judt, Mentes Cativas, em O Chalet da Memória

sexta-feira, abril 12, 2013

Leituras (9)

Depois de uma tarde magnificamente passada no aconchego da biblioteca do ICS, um verdadeiro oásis na cidade de Lisboa, e da autora simpaticamente me ter agradecido o interesse pela sua obra facultando-me um texto que ainda nem sequer foi publicado, prova de que a verdadeira genialidade não esconde o conhecimento mas aspira à sua divulgação, o mínimo que poderia fazer seria mandar vir o último livro que foi publicado e que com o anteriormente editado - "Adhérer à un parti - Aux sources de la participation politique" - me vão ser de grande utilidade. Acabado de chegar, fará as delícias do fim-de-semana que se adivinha. Este ano os carros vão ter que aguardar. 

Brandos costumes

 
"O senhor ministro das Finanças erra constantemente as previsões: sobre o PIB, sobre o défice, sobre a economia da Europa. O que aparentemente não obsta a que seja considerado um homem de suprema competência e um menino querido da UE. Suponho que o tencionam beatificar, se por acaso ele não se enganar mais de 15 dias e apresentar um orçamento que o Tribunal Constitucional aceite. Este ano, pela segunda vez, não aceitou; e Passos Coelho com a criatura à trela resolveu ir a Belém para se queixar ao Presidente. Porquê? Porque provavelmente o génio das Finanças ameaçou emigrar para um país civilizado em que os números concordassem com os dele e não houvesse leis que interferissem com o seu superior serviço. Mas, para nossa futura felicidade, o episódio acabou bem. A pedido pessoal da República, este novo salvador da Pátria prometeu continuar." - Vasco Pulido Valente, Público, 12/04/2013

segunda-feira, abril 08, 2013

Falta de imaginação

Deve haver alguma razão especial. Comunicações aos portugueses às 18:30. Até nisto são parecidos.

Leituras (8)

 
"A crise orçamental e da dívida pode, e deve, ser o pretexto para repensarmos o nosso contrato social e melhorá-lo. A pior coisa que podemos fazer é tomar as medidas que nos são impostas pela troika e nada mudar de essencial no funcionamento da nossa democracia. Porque, à semelhança do que aconteceu no passado (com as anteriores intervenções do Fundo Monetário Internacional), melhoraríamos temporariamente a situação das finanças públicas, para mais tarde cairmos no mesmo."
 
Só no fim-de-semana que findou tive oportunidade de acabar de ler o pedagógico ensaio de Paulo Trigo Pereira publicado na colecção dos cadernos da FFMS com o n.º 24. À semelhança do que aconteceu com outros livros da mesma colecção, este também não foge à regra: é claro, conciso e oportuno.
Sem pretensões académicas, dirigido ao grande público, mas não sendo por isso menos rigoroso, e com sugestões de leitura no final para quem queira aprofundar conhecimentos, o Prof. Trigo Pereira dá-nos uma visão desapaixonada da crise que atravessamos. Mas mais do que isso, há todo um conjunto de propostas tendentes à melhoria da nossa democracia, ao aprofundamento da cultura cívica e elevação dos padrões de decência em que a nossa sociedade e o Estado vivem, que importaria ver discutidas e, se possível consagradas. 
Autor e editor estão,pois, ambos de parabéns por este serviço à comunidade. 
  

sexta-feira, abril 05, 2013

Falta de vergonha

(clique na imagem para ampliar e ver com os seus olhos)
 
Será normal nomear jovens de 21 e 22 anos, que acabaram os cursos em 2012 e 2011, respectivamente, como "especialistas" para exercerem "funções de acompanhamento da execução de medidas do memorando conjunto com a União Europeia, Fundo Monetário Internacional e Banco Central Europeu" e cuja única experiência profissional foram estágios não remunerados realizados com este Governo que se encontra en funções? Que pensarão disto as centenas de milhares de desempregados com qualificações e experiência profissional? Que pensarão disto as pessoas sérias? Que pensar desta gente que os nomeia?    

quinta-feira, abril 04, 2013

Até ao fim


É escusado dizer muito mais porque a declaração fala por si: "falta de condições anímicas" (sic). Nem na hora da despedida o sujeito tem um mínimo de humildade, de sensatez, um pingo de dignidade institucional? E era preciso chegar até aqui, acabar assim? Está tudo dito.
 
Passos Coelho teve do seu capanga a despedida merecida.  

quarta-feira, abril 03, 2013

Hoje escreve o José Gomes André

Com a devida vénia, tomo por empréstimo para aqui vos deixar as geniais e incontornáveis palavras que José Gomes André deixou numa casa onde já morei e continuo a ter bons amigos.
Na hora crítica que o País atravessa, com uma crise económica, financeira e social nunca vista em democracia, com um Governo à deriva e perfeitamente esfrangalhado, errando por aí como um náufrago sem tábua onde se agarrar e com um primeiro-ministro que quer transformar o Tribunal Constitucional numa filial do Banco de Portugal e do Ministério das Finanças, ainda há mainatos sem o mínimo tino a organizarem números de circo. Felizmente que também ainda há quem sem estar comprometido com o passado nem depender do presente continue a ter os olhos no futuro.  

"Nasceu uma nova estrela. Um tal de Miguel Gonçalves, que Miguel Relvas (e quem mais?!) viu no Youtube e convidou para "embaixador" do "Impulso Jovem" (só esta frase já provoca um asco de morte). À semelhança de outros fenómenos da nossa praça, distingue-se pela "irreverência", pelo discurso "positivo" e por outras coisas que vêm sempre juntas neste tipo de pacote ("dinâmico", "criativo", "pró-activo", etc. - é ouvir o dito cujo).
O problema de Miguel Gonçalves não é a referida "personagem", mas o facto de os seus dislates reproduzirem um discurso público cada vez mais difundido e aceite acriticamente pelos media, pelos governantes, pelas elites e pela população em geral. Discurso esse que mistura o pior do "darwinismo social" (o elogio do conflito social e a glorificação da lei do mais forte), um moralismo pseudo-científico de pacotilha (que condena os que sucumbem, imputando-lhes a culpa do seu "insucesso") e os elementos mais abjectos do novo totalitarismo linguístico "made in Wall Street" (que apela ao "empreendedorismo", à "reinvenção pessoal", ao "acreditar em si próprio" e ao "tornar-se senhor do seu destino").
Em suma, estamos perante um discurso político, social e económico que combina as inanidades de livros como "O Segredo" ("tu podes ser quem quiseres") com a profundidade da reflexão filosófica de um Zézé Camarinha. O pior de tudo isto? É que este discurso tem tanto de disparatado quanto de perigoso. Denunciá-lo já não é uma simples questão de bom-senso; é um dever de todos os homens civilizados."

segunda-feira, abril 01, 2013

Chegar, ver e vencer sem a ajuda da troika

Na corrida inaugural do Campeontato FIA GT, Álvaro Parente e Sebastien Löeb conseguiram um resultado histórico para as cores "luso-franco-britânicas". A vitória em Nogaro com o McLaren será seguramente umas das mais recordadas. Esperemos que seja a primeira de muitas, já que Parente não só venceu sem a ajuda da troika como cilindrou a concorrência alemã. Mais notícias no site da FIA

quinta-feira, março 28, 2013

José Sócrates na RTP1

O homem não era um santo, nunca o foi, bem pelo contrário. Não terá o background académico e profissional exigível a qualquer homem que se abalance a ser primeiro-ministro. E, apesar disso, depois de ter sido corrido da forma que foi, justa ou injustamente, o que ontem se viu na RTP1 foi uma lição de comunicação política.
Sócrates mantém os defeitos e as qualidades. Foi igual a si mesmo. E divertiu-se. Percebe-se agora melhor o temor que PSD e CDS/PP tinham em ver o homem a ser entrevistado no horário nobre da televisão pública. 
O que ontem se viu foi de facto uma lição de comunicação política, provavelmente a primeira de várias que se seguirão, por parte de um político profissional que quis ajustar contas com o passado recente. Mas será que depois de tudo aquilo que o acusaram esperavam que o "animal feroz "viesse "mansinho"? 
Não tenho saudades dele como primeiro-ministro, nem como líder do PS. Menos ainda de muitos dos que o rodeavam e que Seguro herdou no grupo parlamentar, nuns casos, ou que, noutros, acabou por colocar nos órgãos nacionais do seu partido. Porém, o que se viu deve ter chegado para muitos portugueses que assistiram ao descalabro dos últimos vinte meses compreenderem o grau de incapacidade política, incompetência comunicacional e má-fé de quem actualmente nos governa.
Espero que Passos Coelho, Gaspar, Santos Pereira e Miguel Relvas tenham visto, pois tiveram uma boa oportunidade de aprender alguma coisa sobre comunicação política. 
Quanto ao Presidente da República, lamento dizê-lo, no seguimento da "esperteza" (não tem outro nome mas está ao nível daquilo a que ele nos habituou) do prefácio, da história das acções da SLN/BCP, das "andanças" de alguns assessores que foram por si protegidos, e da forma como não tem sabido gerir nem a crise nem os silêncios, teve o tratamento que merecia. Não foi bonito, pois não. Mas tendo-se  colocado várias vezes a jeito, algum dia acabaria por levar como levou. Perderam-se algumas, mas a seu tempo virão.
Quanto ao mais, algumas coisas foram esclarecidas, os entrevistadores mostraram pouco à-vontade para contraditarem a avalanche de números e de factos, e o tempo de emissão pareceu-me excessivo.
De qualquer modo, valeu a pena. Depois de tantos meses a ouvir um líder de oposição com estratégia e estilo de seminarista, enquanto "o Relvas" se pavoneia e goza com a Grândola, já fazia falta alguém que desse uma bordoada "nessa gente". Pena que tenha tido que ser José Sócrates a fazê-lo. Os portugueses também não mereciam isso, embora hoje lhe devam estar agradecidos.        

quarta-feira, março 27, 2013

Absolutamente genial


Se há livro que vale o preço, e não me refiro ao papel, é este. Está lá praticamente tudo, tudo, o que de mais e de menos básico se deve saber sobre este período da história europeia. O resto, o que não está neste magnífico livro, está nas restantes obras que Tony Judt nos deixou e que em boa hora foram editadas entre nós. O editor que se abalança a uma obras destas merece uma palavra de apreço. E de estímulo.
Uma escrita clara, simples, cativante. Uma simplicidade desarmante na forma como aborda as questões, a medida exacta do tempo e da importância dos factos.
Tony Judt partiu numa altura em que ainda tinha imenso para nos dar, mas o que deixou acompanhar-nos-á, a todos os que tivemos o privilégio de lê-lo, e saboreá-lo, pela vida fora. Deus não dorme.   

terça-feira, março 26, 2013

Reavivar a memória


A foto é do "The Guardian" e ilusta um texto sobre a ajuda grega e espanhola à Alemanha do pós-Guerra. A chanceler Merkel, que além do mais vivia na zona leste da Alemanha, sob domínio russo, pode ignorar o que então aconteceu, mas é bom que alguém lhe diga o que se passou.  

Lição de bom português

"Para grande parte de nós, Chipre não significará grande coisa, razão que talvez explique - mas não que justifique - que se ande a grafar por aí "o Chipre", acrescentando-lhe um artigo que o país dispensa. Afinal, não passa pela cabeça de ninguém escrever "a Andorra", "o Cabo Verde", "a Angola", "a Paris", "a Cuba", "o Gibraltar", "a Londres" ou "o Istambul", tudo exemplos descaradamente roubados a Mário de Carvalho" - Ana Cristina Leonardo, Expresso, 23/03/2013 
 
Pode ser que com a insistência (Miguel Esteves Cardoso já tinha escrito há algumas semanas um artigo sobre isto no Público) alguns portugueses com responsabilidades, como alguns jornalistas que ganham milhares sem saberem falar, aprendam o básico e deixem de influenciar (mal) aqueles portugueses que os ouvem e nunca tiveram oportunidade de aprender.  

sábado, março 09, 2013

Bem lembrado, melhor escrito

"Com a mudança de Governo e a chegada da troika, Cavaco Silva mudou também. Dantes tão claro, presente e decidido, hoje tão dúbio, ausente e temeroso, parece ter desistido - se não de exercer a função, pelo menos de trabalhar para a História. É para isso que serve o segundo mandato de um Presidente, mas este, por medo ou impotência, tem vindo a apagar-se quando mais se esperava que brilhasse, tantas vezes invocou a sua qualidade de economista para convencer os eleitores de que era o mais preparado para o exercício do cargo." - Fernando Madrinha, Escutar as Vozes, Expresso, 09/03/2013.

segunda-feira, março 04, 2013

Leituras (7)

 
"Em 1957, Corrêa d'Oliveira, à semelhança dos relatórios preparados pela OECE ao longo do período, era da opinião de que os principais problemas que a economia portuguesa enfrentava eram a criação de infra-estruturas de base, a reforma do ensino, o aumento das competências técnicas e a reforma do sistema fiscal. Segundo o relatório económico sobre o país realizado pela OCDE em 1999, e que se mantém actual, as prioridades de Portugal eram o melhoramento de infra-estruturas, o aperfeiçoamento das competências técnicas e a revisão do sistema fiscal. Por conseguinte, não é tão surpreendente que o Portugal democrático tenha adoptado uma política europeia semelhante à do regime autoritário de Salazar. A diferença reside no facto de o Estado Novo não ter reconhecido que a ditadura e o império eram anacronismos". - cfr. página 281.

sábado, março 02, 2013

Leituras (6)

 
"[E]ssential reading in the extent and depth of democratization in the early twenty-first century" - Ian McAllister, Distinguished Professor of Political Science, The Australian National University
 

quinta-feira, fevereiro 21, 2013

Outra vez "o Relvas"?

A razão, salvo raras excepções, nunca está só de um lado. E por vezes é conveniente deixar passar o alarido para se poder olhar com distância e claridade para os factos.
Os “episódios Miguel Relvas” são apenas o culminar de um processo de apartamento dos cidadãos dos seus actuais governantes que nada tem de novo nem de particularmente relevante. O que neles há a notar é a rapidez da erosão, a que não será alheia a degradação da situação social, política e económica a que temos assistido. A cara-de-pau do ministro das Finanças, depois de falhar todas as metas de 2012, a comunicar ao Parlamento que se havia enganado nas contas em 100%, é disso mesmo o melhor exemplo.
Posto isto convém dizer que a democracia não está em causa, que as liberdades e os valores constitucionais não foram postos em causa, e que tudo não tem passado de atitudes de rebeldia e propaganda às quais o ministro Relvas tem emprestado o seu estímulo.
Convenhamos que as coisas só têm a importância e o relevo que se lhe queiram dar. O que aconteceu com Passos Coelho na Assembleia da República no último debate era previsível que se repetisse depois de um grupo de comandos ter feito ecoar o grito de guerra no parlamento. Nessa altura eu critiquei a atitude por muito compreensível que pudesse ser, mas sabia que iria criar um mau precedente. Não me enganei. Na ocasião nem a senhora presidente da AR veio pedir a evacuação das galerias, nem a bancada do PSD, nem o cronista Henrique Raposo, se queixaram.
Agora que as coisas começam a piar mais fino já vêm falar, imagine-se, em fascismo. São eles e Mendes Bota quando este há uns anos comparava a ASAE a uma “nova PIDE”. Haja decência e tino, senhores.
Evidentemente que o que se passou no Clube dos Pensadores ou no ISCTE não é nem foi bonito. Porém, importa também perguntar qual a medida de participação de Miguel Relvas para o que aconteceu. Com Passos Coelho e Paulo Macedo os protestos fizeram-se ouvir. A seguir os manifestantes calaram-se ou foram-se embora e tudo prosseguiu. Com normalidade. Uns protestaram, os outros discursaram.
De diferente nos “episódios Relvas” foi a provocação, foi a petulância.
Quando um ministro com a pose, o estilo e a arrogância de Relvas, se predispõe a participar num protesto em que ele é o visado, ensaiando cantar de forma desafinada e sem sequer conhecer a letra uma canção simbólica da democracia portuguesa, só pode estar a querer gozar com aqueles que se manifestam.
De igual modo, quando um ministro cujo currículo académico e profissional tem tanto de medíocre quanto de sofrível e de nebuloso, com um diploma feito de equivalências e folclore, que nem a privatização de um canal da RTP conseguiu levar a bom porto, depois de andar a atirar foguetes no Copacabana Palace com Dias Loureiro e Marques Mendes, e mais a mais numa altura em que os estudantes mais carenciados não têm bolsas nem dinheiro para propinas e o país sofre a bom sofrer com a insânia dos economistas ao serviço do Governo, se predispõe a discursar numa das melhores escolas públicas portuguesas sabendo que a hostilidade em relação à sua figura vem em crescendo, só pode estar a provocar o pagode.
E a sua falta de vergonha e de senso é tão grande que nas tristes imagens que se viram ainda deu para ouvir Sua Excelência a dizer à segurança, que naturalmente não lhe fez a vontade, que queria sair, naquelas circunstâncias, pela porta por onde tinha entrado, no que não pode deixar de ser entendido como mais uma atitude provocatória e de desafio.
É verdade, nisso estamos todos de acordo, que o que se viu no ISCTE ou há dias em Gaia foi lamentável e não pode ser acolhido por ninguém. Não há “arruaças democráticas”, não há “enxovalhos democráticos”, não há “insultos democráticos”. A democracia tem de saber conviver com os excessos de alguns e há mecanismos para corrigir esses excessos.
Por isso mesmo, antes de se apontar o dedo aos “indignados”, seria bom que Passos Coelho e os membros do seu governo, em especial Miguel Relvas, percebessem, como escreveu Tony Judt, uma coisa muito simples: “A seriedade moral na vida pública é como a pornografia, difícil de descrever mas imediatamente identificável quando a vemos. Descreve uma coerência de intenção e de acção, uma ética de responsabilidade política. Toda a política é a arte do possível. Mas também a arte tem a sua ética”.
De outra forma, como esse mesmo autor também escreveu, a política transformar-se-á num fraco produto do qual só sairá o tagarelar constante e uma retórica infindável para disfarçar o vazio. Não creio que Judt conhecesse o ministro Relvas e se estivesse a referir a ele. Daí que as suas palavras tenham ainda mais significado quando se olha para o que se passou entre nós.

sexta-feira, fevereiro 15, 2013

Os contribuintes são cobaias?

Esta notícia do Público é reveladora do que abaixo referi: entrámos já na fase da "gozação" com os contribuintes, agora transformados em cobaias tributárias. A acção não tem nada de pedagógico, não visa informar, mas sim testar os limites da paciência dos contribuintes para se ver até onde estes se deixam atropelar, pisar, espezinhar.

Alguém que nos acuda

Aqui há uns meses, a propósito do arrendamento de uma casa de férias no Algarve, onde passou duas semanas de Agosto, o Diário de Notícias quis questionar o primeiro-ministro sobre se tinha pedido factura ao proprietário da casa onde se alojou. Pedro passos Coelho considerou a pergunta uma intromissão na sua vida privada e como tal escusou-se a prestar esclarecimentos.
Agora, o fisco anuncia a obrigatoriedade de todo o cidadão, por transacções de valor insignificante, exigir factura sob pena de lhe ser aplicada uma multa que pode ir dos € 75,00 a € 2.000,00. Pretende o fisco que os cidadãos se substituam a acção dos seus próprios fiscais e se transformem em bufos da máquina fiscal. Um verdadeiro nojo.
Um ex-secretário de Estado do governo de Passos Coelho, dirigindo-se ao seu secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, já se manifestou sobre o assunto, em termos que, não sendo os mais curiais num debate público, são seguramente os mais genuínos e que melhor espelham aquele que será o sentimento da maioria dos portugueses que paga impostos em relação a uma política fiscal fraudulenta e a uma actuação do fisco que raia o absurdo e se aproxima rapidamente do intolerável.
Independentemente da situação do país, a falta de senso (já nem digo bom, que este há muito desapareceu), o desatino das decisões que vêm sendo tomadas, a profunda iniquidade tributária e a forma despudorada como o fisco e seus agentes vêm actuando, em situação que se assemelha a um verdadeiro 'gangsterismo' fiscal em que tudo vale para aumentar a colecta - de cálculos de juros errados, a avaliações patrimoniais via "Google" e a interpretações das leis fiscais que invariavelmente acabam em prejuízo do cidadão que se quiser defender os seus direitos será obrigado a derreter rios de dinheiro a alimentar a ineficiência da máquina judicial - em qualquer outro país que tivesse uma opinião pública forte e uma elite política e intelectual com dimensão e dotada de uma aceitável consciência cívica, seria impensável e já teria gerado uma fronda.
Os resultados da execução orçamental de 2012 são um desastre, aproximando-nos rapidamente dos níveis de rendimento e dos padrões de vida de há três décadas, com uma miséria em crescendo e um empobrecimento geral das classes remediadas.
Bem sei que o que está a acontecer não é mais do que a penalização pela falta de empenho cívico e político da maioria dos portugueses que de há muito se resignou a entregar a política, a que diz respeito à vida de todos nós, a grupos de fedelhos mal estruturados, ignorantes e oportunistas que medravam nas organizações juvenis dos partidos políticos. Mas isso não justifica a passividade com que a generalidade dos portugueses continua hoje a encarar as coisas e a reagir aos maiores atropelos, enqaunto autarcas condenados continuam a fazer uso de expedientes dilatórios para se manterem em funções, e outros se permitem ler na lei aquilo que lá não está para proteger os interesses das suas camarilhas.
Há muito que apelei a uma fronda cívica, a um levantamento da sociedade civil contra o atavismo, a ignorância política e a prepotência tributária.
Perante um Estado tributário-pidesco, que quer transformar todos os portugueses em pides, bufos e fiscais ao seu serviço, com um poder político pantanoso (e merdoso), o problema já não se resolve com desabafos e expressões como a de Francisco José Viegas.
Por isso mesmo, deixo aqui um apelo à sociedade civil, aos homens bons deste país, à gente que consegue ler e ver para lá da opacidade dos partidos e que se habitou a lutar pelas suas ideias, que reconhece a existência de um sentimento nacional que se sobrepõe às conveniências conjunturais, ao tacticismo político, aos interesses de meia-dúzia de traficantes de influências e vendedores de banha da cobra, a gente que vai da direita à esquerda, de Adriano Moreira a António Barreto, de Pacheco Pereira a Pedro Lains, de José Reis a Medina Carreira, de Maria Filomena Mónica a Vasco Graça Moura, de Eduardo Lourenço a Bagão Félix, de Hélder Amaral a Francisco Louçã, e peço-lhes que se manifestem, que congregueme sforços, que unam num movimento único, genuíno, de defesa da cidadania e do interesse nacional que obrigue à capitulação da asneira e chame à razão o Presidente da República, obrigando-a a sair do seu sarcófago e a intervir.
Está na hora de Cavaco Silva fazer alguma coisa por Portugal e pelos portugueses que seja um pouco mais do que um acervo de frases triviais e inócuas.
Está na hora de ser formado um governo de iniciativa presidencial que conduza o país até ao final do cumprimento do memorando com a troika e que prepare o país para as legislativas de 2015.
Portugal não pode correr o risco de suportar durante mais uma dezenas de meses a incompetência, a ignorância, a teimosia e a pesporrência de Coelho, Gaspar, Relvas, Borges, Santos Pereira e de toda a sua trupe de coveiros pefumados.
Os portugueses têm o direito de viver com dignidade cumprindo as suas obrigações. E têm também o dever de exigir dos seus políticos o respeito pela razão, pela seriedade da actuação política e um mínimo de sentimentos de compreensão e humanidade perante a verdadeira tragédia social e moral que neste momento se abate sobre a maioria da comunidade. 

sábado, fevereiro 09, 2013

Leituras (5)


"Soft power arises in large part from our values. These values are expressed in our culture, in the policies we follow inside our country, and in the way we handle ourselves internationally". Joseph S. Nye Jr.